Biologia e Manejo


Por que as Sempre-vivas estão sempre vivas ?

As plantas conhecidas como Sempre-vivas são assim chamadas pois após a colheita seus escapos (caule) e inflorescências (conjunto de flores pequenas) mantém a aparência viva por anos e até décadas, o que as tornam únicas, com alto valor comercial (Figura 1). Muitas das espécies de Sempre-vivas comercializadas são encontradas no Bioma Cerrado, nas regiões Centro-Oeste e Sudeste do Brasil. Porém, é principalmente nos campos rupestres, tipo de ambiente que ocorre no topo de regiões montanhosas (serras), especialmente nos Estados de Minas Gerais, Bahia e Goiás, que crescem as famílias de Sempre-vivas de maior valor de revenda. São estas Eriocaulaceae, Poaceae (Gramineae), Xyridaceae, Cyperaceae e Rapateaceae.


Figura 1: Exemplos de Sempre-vivas. Fonte: adaptado de Flora Brasiliensis.


Algumas espécies de Sempre-vivas comercializadas em Diamantina/MG são amplamente encontradas na Cadeia do Espinhaço, que é um conjunto montanhoso que abrange os estados de Minas Gerais e Bahia (Figura 2). Com o ambiente típico de campos rupestres, a Cadeia do Espinhaço se torna um local perfeito para o aparecimento destas plantas.

Figura 2: Cadeia do Espinhaço. 
Arte: adaptado por Maíra Goulart

Ainda está em estudo o motivo das Sempre-vivas manterem suas características por longo tempo mesmo após sua morte. Sabe-se que as características que conferem esta “durabilidade” é uma resposta ao ambiente em que vivem. Durante milhões de anos, as Sempre-vivas foram se adaptando às condições dos campos rupestres, que incluem pouca água (ambiente seco), calor e ventos excessivos. As características anatômicas e fisiológicas destas plantas as protegem de um ambiente bastante hostil, podendo então deixá-las também mais resistentes aos processos de decomposição.

A Professora Dayana Francino, da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) desenvolve um projeto de extensão chamado "Sempre-vivas sob o olhar microscópico: uma estratégia de ensino-aprendizagem em anatomia vegetal" com o intuito de construir materiais didáticos sobre anatomia vegetal das espécies mais comercializadas. A Anatomia Vegetal é um ramo da Botânica que estuda quais os componentes que formam o organismo das plantas. Desse modo, foi feita uma demonstração pela professora e alunas do curso de Ciências Biológicas da UFVJM para a comunidade  de artesãos de Galheiros-MG demonstrando quais características das Sempre-vivas fazem-nas permanecerem sempre vivas (Video 1). Abaixo da entrevista, há exemplos de fotos tiradas por microscópio, mostrando como são as Sempre-vivas por dentro. (Figuras 3, 4 e 5).





Vídeo 1: Demonstração da anatomia das sempre-vivas com a Prof. Dr. Dayana e as alunas de Ciências Biológicas da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.

Figura 3: Rhynchospora globosa - nome popular: Espeta Nariz - Corte transversal da raiz aumentado em 10x. As fibras estão com coloração vermelha e acredita-se que estas são responsáveis pelas características de permanecerem Sempre-vivas.
Foto: Mariana Generoso




Figura 4: Rhynchospora globosa - nome popular: Espeta Nariz - corte transversal da folha aumentado em 10 x. As fibras estão com coloração vermelha e acredita-se que estas são responsáveis pelas características de permanecerem Sempre-vivas.
Foto: Mariana Generoso 




Figura 5: Comanthera elegans - corte transversal do caule aumentado em 40x. As fibras estão com coloração vermelha e acredita-se que estas são responsáveis pelas características de permanecerem Sempre-vivas.
Foto: Mariana Generoso



Este vídeo contém uma entrevista com os artesãos Senhor João Borges e Senhor Geraldo Borges demonstrando as espécies de Sempre-vivas mais comercializadas, com seus nomes populares (Video 2).


 



Vídeo 2: Entrevista com os artesãos de Sempre-vivas.



Cultivo e Manejo


O manejo correto das Sempre-vivas é de grande importância para garantir a proliferação das espécies, principalmente para as pessoas que dependem delas economicamente.          


Algumas técnicas devem ser levadas em conta como, por exemplo, a prática do restolho: consiste em não coletar uma determinada quantidade de plantas, para garantir a produção de sementes por essas. Todas as técnicas, como a citada, levam em consideração o período reprodutivo destas plantas. Na maioria das vezes procura-se coletá-las em períodos onde já aconteceu a reprodução, dessa forma, as sementes que irão gerar as novas plantas já foram espalhadas, garantindo a nova geração de indivíduos.            


Hoje em dia, os coletores da comunidade de Galheiros-MG têm certo cuidado no momento da extração. Eles dobram a parte inferior da haste (Figura 1) antes de retirá-la, evitando assim que partes importantes da planta sejam arrancadas, como a raiz e a roseta (Figura 1). Assim, essa mesma planta poderá produzir novas hastes ao longo dos anos que futuramente irão gerar novas flores. As flores são os órgãos reprodutivos das plantas, mas não é apenas por meio das flores que as Sempre-vivas se reproduzem. Uma planta pode originar outras por meio de brotamentos na roseta ou na raiz, um tipo de reprodução conhecida como assexuada ou clonal.

Utilizando as técnicas de manejo corretamente é possível diminuir a chance de novas espécies de Sempre-vivas entrarem em extinção e diminuir a chance de espécies que já correm risco de serem extintas, desaparecerem de vez.
Assim, para se conhecer melhor sobre a reprodução das Sempre-vivas e sobre suas técnicas de cultivo, convidamos vocês a assistir as duas entrevista abaixo. Uma feita com o artesão Senhor João Borges da comunidade de Galheiros e outra com a Professora Maria Neudes da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Segue-se abaixo trechos das duas entrevistas, mostrando a interessante correlação que se pode fazer entre o conhecimento popular e o conhecimento científico:

Entrevista com o Senhor João Borges:

Entrevistador: Como vocês colhem as Sempre-Vivas?

Senhor João Borges: Quando a gente chega no campo, vai panhando com cuidado, bem devagarinho, para não tirar o pezinho da planta. Tira o cabinho, mas deixa a raiz. Isso é feito pra todas as espécies.

Entrevista com a Professora Maria Neudes:


Entrevistador: Existe um manejo correto para que os danos nas plantas coletadas sejam minimizados? Mesmo sem as sementes estas plantas podem reproduzir assexuadamente?


Maria Neudes: Sim (...) a parte comercializada é a parte reprodutiva. Então o que geralmente pode ser retirado é inflorescência, e sem as sementes elas podem reproduzir assexuadamente.



Percebemos que o artesão tem todo o cuidado de manter as partes vitais da planta durante sua colheita, “vai panhando com cuidado, bem devagarinho, para não tirar o pezinho da planta”. Isso possibilita que a roseta (o pezinho da planta) produza novas flores no futuro. A professora chama atenção para outra vantagem em manter a roseta no solo: a possibilidade dela originar outras rosetas, ou seja, novos indivíduos, por meio da reprodução assexuada.

Curiosidade

Plano de Ação para a conservação das Eriocaulaceae do Brasil – PAN Sempre -vivas

Os Planos de Ação Nacional para a Conservação das Espécies Ameaçadas de Extinção (PAN) são políticas que identificam e norteiam ações prioritárias para combater as ameaças que deixam em risco populações de espécies naturais e assim protegê-las. Várias espécies de animais e vegetais estão inseridas no PAN, dentre elas as Sempre-vivas.

A meta principal do PAN Sempre-vivas visa promover a manutenção da diversidade das Euricaulaceae através da diminuição da perda de habitats e outras ameaças, para que estas não possam ser extintas. O PAN abrange 16 espécies ameaçadas de extinção e estabelece estratégias para proteção de outras consideradas em risco e/ou com deficiência em dados. Ele é composto por um objetivo geral, com 5 metas (Tabela 1). Este plano foi criado em 2011, pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) em reunião com especialistas e não houve participação da comunidade extrativista. Tais ações estão centradas nos seguintes estados: Minas Gerais, Bahia, Goiás, Tocantins, Amazonas e Santa Catarina.

Tabela 1: Objetivo geral e os 5 objetivos do PAN - Sempre-vivas.







 


Fonte: Site do ICMBio - PAN SEMPRE-VIVAS 



ESPÉCIES AMEAÇADAS:


Actinocephalus cipoensis, Actinocephalus cilicatus, Actinocephalus claussenianus, Comanthera bahiensis, Comanthera brasiliana, Comanthera harleyi, Comanthera magnifica, Comanthera mucugensis, Comanthera suberosa, Comanthera vernonioides, Comanthera vernonioides, Paepalanthus crinitus, Paepalanthus extremensis, Paepalanthus hydra, Paepalanthus rhizomatosus e Paepalanthus scytophyllus.



 Figura 6: Espécie - Comanthera magnifica / Nome popular: Sempre-viva. 
Fonte: PAN Sempre-vivas

 Figura 7: Espécie - Comanthera mucugensis / Nome popular: Sempre-viva pé de ouro. 
Fonte: PAN Sempre-vivas

 Figura 8: Espécie: Actinocephalus ciliatus / Nome popular: Casadinho, em brotamento.
Fonte: PAN Sempre-vivas

 
 Figura 9: Espécie: Comanthera vernonioides / Nome popular: Jazida. 
Fonte: PAN Sempre-vivas

 
 Figura 10:  Espécie: Comanthera mucugesis / Nome popular: Sempre-viva pé de ouro. 
Fonte: PAN Sempre-vivas

 Figura 11: Espécie: Actinocephalus cabralensis / Nome popular: Chuveirinho. 
Fonte: PAN Sempre-vivas

Figura 12:  Espécie: Comanthera suberosa / Nome popular: Sempre - viva. 
Fonte: PAN Sempre-vivas


Postado por: Cleiton Cordeiro, Marcell Campos, Marcelo Silva e Thaís Viana

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